Hoje de manhã, veja você, o Nada tocou minha campainha.
Abri a porta, mas não era ninguém.
Maldita personagem é o Nada!
Saí pela rua e olhei para as pessoas.
No centro, quase todas de cara pálida,
rezavam seus rosários impávidas,
reclamantes de pormenores
insignificantes.
O Nada rondava-me,
espreitava na esquina, imutável;
imperceptivelmente camuflado
entre a hora do desjejum
e o almoço, entre os pedaços
rasgados de um bilhete de loteria.
O dia passa:
Li no jornal tragédias;
assisti na tv melodramas;
dormi sozinho numa cama.
Acordei para o café que coei, para a manteiga que passei
na bisnaga.
Eis a vida que me cabe;
a escolhi sem perceber,
sempre partindo numa reta imaginária;
sempre cabendo sem caber.
Abandonei-me entre escolhas e vontades,
entre pessoas que simplesmente
esqueces-te depois de sua passagem.
Enfim, quando jovem
não conheci amigo mais fiel
que o cigarro.
Tanto, que na sua ausência
não pude nem parar de me mexer. Tremia.
Na sua abstinência, aprendi que estou
sozinho. Oh saudade que traz a chuva,
como é bom fumar no frio...
Oh saudade melancólica que me traz um arrepio!
Sucumbo à vontade,
acendo o pavio da minha sorte.
Minha morte é programada,
tão certa quanto essa fumaça.
Veja só: ajudo-me a matar o tempo
com o alento do que me mata.
No final, somos todos muito
parecidos com o teor crítico
que preenche o
Nada.
Fabiano Martins
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Oi,Famartan!Passando para conhecer seu blog,já que estais me seguindo.Pois é ao fim e ao cabo estamos sempre sós, e vícios acho que todos temos,o cigarro é um complicado eu nunca pus na minha boca para minha sorte ou falta dela,vai saber....
ResponderExcluirBeijosss
Oi, Flor de Lótus!
ResponderExcluirObrigado pela visita. Eu parei de fuma há dois anos. Acho que foi sorte.
bjs
Todo vício se torna vício quando o mesmo é identificado como melhor amigo, esperado em nossa vida como se fosse um grande amor tornando muitas vezes o tudo que temos em nada, mas pensando bem não é do nada que tudo surge? Digo não deve ser esse o ponto de partida? E o melhor o ponto de partida para qualquer direção, quem sabe dê de escolher a direção que lhe deixa feliz! :D
ResponderExcluirViva! Se a vida é curta ou não procure viver feliz, seja com vício ou sem se é bom pra ti sorria sem medo e lute sem receio.
Obrigada por me seguir... Lindo Blog!
Marílis,
ResponderExcluirSim, é do nada que tudo surge. O nada é o avesso do vício, mas os dois lembram o que somos. Por isso, é preciso vigiar e refletir.
bjs e obrigado pela visita!
Seu texto é sincero, inteligente e muitíssimo bem escrito. Eu não tenho muito o que dizer, apenas que achei seu texto incrível. Passarei aqui mais vezes, estou te seguindo também.
ResponderExcluirUm beijo.
Emanuele,
ResponderExcluirObrigado pelo carinho das suas palavras.
Sempre que passar por aqui, seja bem-vinda!
Bjs
Nossa, gostei muito desse texto, principalmente pelas palavras verdadeiras que expõe seu modo de pensar.
ResponderExcluirAlgo que chamou muito minha atenção em seu blog foi sua frase de perfil "menos o rídiculo dos versinhos sorridentes..." ADOREI!!
Estou seguindo
beijos
"sempre cabendo sem caber"
ResponderExcluirEu senti a essência do poema nesta frase...
sempre cabendo algum pedaço sem caber...sempre não cabendo em algum espaço que nos cabe...entre vícios e tragédias, o nada a espreitar...
Estou ficando viciada neste blog, por falar em vício. ;)
Moni,
ResponderExcluirSeja bem-vinda! A frase é do Torquato Neto.
Eu gosto muito dessa citação:
PESSOAL INTRANSFERÍVEL - Torquato Neto.
"escute, meu chapa: um poeta não se faz com versos. É o risco, é estar sempre a perigo sem medo, é inventar o perigo e estar sempre recriando dificuldades pelo menos maiores, é destruir a linguagem e explodir com ela. Nada no bolso e nas mãos. Sabendo: perigoso, divino, maravilhoso. poetar é simples, como dois e dois são quatro sei que a vida vale a pena etc. Difícil é não correr com os versos debaixo do braço. Difícil é não cortar o cabelo quando a barra pesa. Difícil, pra quem não é poeta, é não trair a sua poesia, que, pensando bem, não é nada, se você está sempre pronto a temer tudo; menos o ridículo de declamar versinhos sorridentes. E sair por aí, ainda por cima sorridente mestre de cerimônias, "herdeiro" da poesia dos que levaram a coisa até o fim e continuam levando, graças a Deus. E fique sabendo: quem não se arrisca não pode berrar. Citação: leve um homem e um boi ao matadouro, o que berrar mais na hora do perigo é o homem, nem que seja o boi. adeusão."
bjs e obrigado pela visita.
Jaci,
ResponderExcluirMuito motivador saber disso!
bjs e obrigado pelas visitas!
Bom dia Famartan,
ResponderExcluirLinda e reflexiva poesia.
Profunda, como é a sua essência poética.
Aqui, espero que seja só aqui, você vestiu a pele de um homem, que se sente só, sem nada e de mão dada com ele, tendo o cigarro, como seu único companheiro e elemento de prazer e de morte.
Quero, que o meu amigo transitivo, seja bem mais feliz.
Lhe envio sorrisos e cravos brancos.
Beijos de luz.
Oi, LUZ!
ResponderExcluirNão é biográfico; é fruto de observação e reflexão. Obrigado pelos sorrisos e cravos brancos!
bjs
o nada que às vezes é tudo.
ResponderExcluirsim
ResponderExcluirLa lucha contra la adicciones es muy despareja, pero dicen que se puede. Un abrazo
ResponderExcluirÉ preciso ser forte. Abraço
ResponderExcluir